HOMENSAGENS

 

HOMENAGENS A PESSOAS NEFASTAS

 

Nelson Marzullo Tangerini

 

               Recentemente, lúcidos intelectuais britânicos resolveram remover estátuas e placas que homenageavam pessoas comprometidas com a escravização de africanos ou com o extermínio de ameríndios e aborígenes ou a exploração de indianos, um exemplo a ser seguido por nós, brasileiros, chegados à idolatria.

               Poderíamos retirar, “sem dó nem piedade”, diversos nomes de ruas, praças, bairros, pontes e estátuas que homenageiem escravocratas e fascistas.

               Comecemos, pois, com o Generalíssimo Franco, nome de rua em Bangu, bairro da Zona Oeste do Rio de Janeiro. A Rua Francisco Franco poderia chamar-se Rua Poeta Garcia Lorca,  fuzilado pelos fascistas.

               Falto semelhante acontece em nossa vizinha Niterói, onde existe uma rua com nome do Coronel Moreira César, bastante conhecido no sul como “Cortador de cabeças”, em virtude de suas atividades criminosas na Guerra do Paraguai. O coronel em questão passou por Nossa Senhora do Desterro, hoje Florianópolis, Santa Catarina, onde demonstrou claramente seu racismo e intolerância ao perseguir o poeta simbolista Cruz e Sousa, que diante da cisma do arrogante senhor, teve de providenciar sua mudança para antiga Capital Federal, o Rio de Janeiro. O episódio é narrado no livro “Reencontro com Cruz e Sousa”, escrito por Uelinton Farias Alves (Tom Farias) e publicado pela editora catarinense Papa-Livro Clube, em 1990.

               Depois de todos esses atos criminosos e impunes, o coronel reaparece em Canudos, no interior da Bahia, onde morre em conflito com os bravos sertanejos canudenses, que provaram, com sua valentia, serem, antes de tudo, fortes.

               É, portanto, muito justo que, hoje, a referida via passe a chamar-se Rua Ator Paulo Gustavo, niteroiense, em homenagem a este legítimo semeador de gargalhadas, que, com sua arte, seu humor e sua alegria, nos deixaram mais leves, neste país que flerta com o fascismo e a violência.

               Outro exemplo: Rocha Miranda, o Barão de Bananal, escravocrata, foi homenageado, ganhando nome de bairro da Zona Norte do Rio. Quem assistiu ao filme “Menino 23”, teve a oportunidade de conhecer a trajetória da família Rocha Miranda, cujos descendentes abraçaram o nazismo e tornou a escravizar  meninos negros em sua olaria, onde fabricavam telhas com suásticas.

               Passemos, então, para o Barão de Cotegipe, o Senhor João Maurício Wanderley, agraciado com nome de rua em Vila Isabel. Este cidadão nefasto votou contra a Lei Áurea, que abolia a escravização de africanos, outrora caçados em África como animais  e  trazidos para o Brasil, onde foram trabalharam de graça e foram açoitados e humilhado. Wanderley foi presidente do Conselho de Ministros de 1885 a 1888, além de presidente do Senado Federal, ministro das Relações Exteriores, Ministro da Marinha, presidente do Banco do Brasil e senador pela Província da Bahia por mais três décadas.

               Emprestando sua pena romântica para a causa anti abolicionista, o escritor  José de Alencar, autor de inúmeros livros que descaracterizam a cultura indígena,  passou a escrever cartas para o Imperador de plantão, nas quais sustentava a tese de que a escravização fazia parte do processo civilizatório, entre outras aberrações que nos levam ao vômito. As missivas, etnocêntricas, vieram a tona com o nome de “Cartas contra a Abolição”, cartas essas que causaram um grande impacto entre literatos e historiadores. A Praça José de Alencar, no Flamengo, não poderia mudar de nome?

               A Ponte Rio-Niterói chama-se Costa e Silva. Um movimento forte tenta tirar o nome do general da referida ponte, uma vez que Costa e Silva foi conivente com as prisões, as torturas e os assassinatos durante a ditadura militar. Pensou-se até em chama-la Ponte Machado de Assis.

               Fato semelhante aconteceu em Lisboa, Portugal, quando, após a Revolução dos Cravos, a Ponte António de Oliveira Salazar, que liga Lisboa a Almada, e vice-versa, passou a chamar-se 25 de abril.

               Saindo da atmosfera fluminense, encontraremos, no bairro Butantã, em São Paulo, Capital, a Rua Plínio Salgado, homenagem a um líder integralista que venerava Mussolini e sonhava com o fascismo à brasileira. O integralismo abrigava, em seu movimento, fascistas e nazistas. Os nazistas, como sabemos, acreditavam na superioridade da racial e pregavam o ódio aos judeus.  

               Em São Paulo, encontraremos ainda o Monumento às Bandeiras, uma obra modernista de Victor Brecheret, que homenageia os Bandeirantes, que exterminaram inúmeras povoações em São Paulo e Minas Gerais. Por onde as Bandeiras passaram, inúmeras aldeias indígenas foram exterminadas. Talvez Brecheret nada tenha aprendido com Mário de Andrade e Oswald de Andrade, que foram buscar inspirações tanto nas culturas indígenas quanto na cultura afro-brasileira. Protestos aconteceram, mas não incentivo a destruição do monumento, até porque o italiano foi um grande artista. Mas penso que uma placa deve ser colocada no local, avisando ao público que os Bandeirantes, longe de serem desbravadores, eram um bando de cruéis  assassinos.

               Outros monumentos e outras ruas e praças devem existir por este grande Brasil homenageando pessoas nefastas. Gostaria de saber qual governante decidiu homenagear fascistas, nazistas e supremacistas.

               Que tal iniciar um grande movimento para que essas figuras desumanas caiam no esquecimento?  E se figurarem nos livros de História, que sejam lembradas como inimigas da Humanidade.

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