GENOCÍDIOS
OS
GENOCÍDIOS CONTINUAM
Nelson
Marzullo Tangerini
Após ler minha crônica “Amazônia for salle”,
uma professora, amiga de muitos anos, me faz uma observação: “Você não falou
dos índios, vítimas deste governo genocida”.
Pois bem, começo, então, por uma
declaração de nosso ilustre e culto presidente, que declarou, não faz muito
tempo, que mais felizes eram os Estados Unidos, que dizimaram inúmeras tribos
indígenas em seu território.
Convidado a assistir a uma
palestra num centro espírita do Méier, acabei por ouvir a oradora explanar
sobre a “grandeza” dos Estados Unidos da América, país democrático, que soube
abraçar culturas apostas às suas.
Como não podemos interpelar um
orador no meio de uma palestra espírita, quando uma audiência obediente e sem questionamentos a assiste, deslembrada,
esperei até ao final da exposição para perguntar se a oradora, professora de
inglês, havia lido o livro “Enterrem meu coração na curva do Rio, de Dee Brown.
E a resposta não foi outra: não conhecia o livro e nem sabia de sua existência.
Provavelmente, o capitão, avesso
aos livros, principalmente os de Antropologia e Sociologia, e mais preocupado
com a liberação da venda de armas, também não o leu.
Este desgoverno, infestado de
pessoas despreparadas, desconhece que os povos indígenas das Américas já
habitavam estas terras muito antes da invasão dos europeus, sequiosos de
riquezas; como desconhece, também, que esses colonizadores estiveram na África,
onde capturaram seres humanos, que seriam escravizados, torturados e mortos no
“Novo Continente”.
Quando estive na Rio 92, em
1992, portanto, tive contato com povos de todo o mundo. E a queixa era a mesma:
perda de suas terras: nos EUA e no território do Alasca, no Canadá, nos
territórios da Rússia Oriental, no Japão, na Nova Zelândia, na Austrália, em
todo o continente latino-americano.
As queixas vão além de suas
terras perdidas, e conquistadas pelo invasor, mas também da demonização a que
suas crenças religiosas sofrem por parte de “missionários” que tentam
convertê-los, insistentemente, ao cristianismo. Considerando que a língua é parte da cultura,
tese defendida pelo linguista romeno Eugênio Coseriu, muitos desses povos vêm perdendo, também suas
línguas originais.
No meio da pandemia, em que se
tenta passar a boiada, cantei a pedra: madeireiras e garimpo em terras
indígenas levariam a covid para esses povos, o que demonstra, como se
demonstrou, uma campanha “clara” de extermínio, de genocídio declarado, uma vez
que os índios são um obstáculo para a ganância dos grandes empresários do ramo
madeireiro ou do garimpo, que vêm usando mercúrio, indiscriminadamente nos
rios.
Certa vez, numa praça do Méier,
tive o desprazer de conhecer pessoalmente o capitão, acompanhado de sua gang.
Eles distribuíam santinhos que anunciavam – e demonstravam – todo o seu ódio às
populações indígenas do Brasil. Declarava, desde aquele ano, que anularia as
demarcações de terras indígenas.
Empossado presidente, o
tresloucado capitão deixou claro que, no seu governo, os índios não teriam um
centímetro de terra.
O gado festivo que o acompanha e
o idolatra, sem qualquer conhecimento de Antropologia e Sociologia, também
repetem essa cantilena nazifascista, de que as minorias ou se enquadram no
“novo” sistema de governo ou desparecem. “Clareando” o discurso: serão
exterminados.
Lamentavelmente, caminhamos para
um retrocesso. O discurso negacionista – incluindo aí a negação outro, do
“diferente” – é muito semelhante aos tenebrosos discursos proferidos na idade
média ou mesmo pelos colonizadores – ainda contaminados pelos ideais da Idade
das Trevas -, que aportaram neste continente nos idos 1500. Para esses idiotas
iletrados, a Terra é plana e os povos, sem almas, precisam se converter ao
cristianismo.
Na Alemanha nazista, grande
parte da população adorava e idolatrava Hitler e sua turminha de genocidas. O
mesmo aconteceu na Itália, em Portugal, na Espanha, com o apoio luxuoso e
irrestrito da Santa Madre Igreja Católica.
A história, tão odiada pelos
nazifascistas, ensina-nos que não devemos repetir os erros do passado, pois a
humanidade, naquele momento, em meio ao ódio, perdeu toda a sua generosidade,
levando as pessoas a venerarem genocidas.
Conservadores alemães geraram
Hitler; conservadores italianos geraram Mussolini, conservadores brasileiros
geraram os militares de 1964 e o atual presidente.
Esses monstros, chamados de
mitos, foram eternos? Não foram. Mas deixaram estragos imensos para futuras
gerações, que tiveram que reconstruir suas nações. Por que temos de passar por
isto outra vez: pela destruição e, depois, pela reconstrução? Por que a
humanidade perde tanto tempo investindo na reconstrução do que foi destruído?
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